Nossa Senhora de Lourdes
Nossa Senhora de Lourdes
Nossa Senhora de Lourdes! Onde encontraremos os termos que alcancem exprimir tudo quanto esse nome significa para a piedade católica no mundo inteiro? Quem poderá traduzir em palavras o ambiente de paz que envolve a gruta sagrada na qual, há mais de 150 anos, a Santíssima Virgem apareceu à humilde Bernadette e inaugurou, de modo definitivo, um novo vínculo com a humanidade sedenta de refrigério e paz? Por desígnio da Divina Providência, a esse lugar associou-se uma ação intensa da graça, especialmente capaz de transmitir aos milhares de peregrinos, vindos de longe, a certeza interior de serem suas preces benignamente ouvidas, seus dramas apaziguados, e suas esperanças fortalecidas.
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Com efeito, ao longo deste século e meio, as ásperas rochas de Massabielle tornaram-se palco das mais espetaculares conversões e curas, legando à Santa Igreja Católica um tesouro espiritual de valor incalculável.
Em Lourdes fatos se revestem de uma grandiosidade peculiar, diante da qual nossa língua emudece. Ali está, diante de nós, a sublimidade do milagre. Entretanto, não se pode falar de Nossa Senhora de Lourdes sem nos lembrarmos com veneração da personagem ligada de modo indissociável a essa história de bênçãos e misericórdias.
A modesta pastorinha a quem Nossa Senhora de Lourdes apareceu é o primeiro e maior prodígio de Lourdes: ela simboliza a íntegra fidelidade aos apelos de conversão e penitência, que naqueles dias foram lançados pela Rainha dos Céus, os quais haveriam de chegar aos mais longínquos recantos da Terra.
Celestial surpresa
Na manhã inolvidável de 11 de fevereiro de 1858, Bernadette saiu com a irmã Toinette e a amiga Jeanne Abadie para o bosque, a fim de recolherem gravetos para a lareira e ossos para vender a fim de comprarem algum alimento. Andaram bastante até chegarem à gruta de Massabielle, onde Bernadette nunca havia estado. Enquanto as vivazes meninas atravessavam a água gelada do rio Gave, Bernadette se preparava para fazer o mesmo.
Eis sua própria narração do que então sucedeu: “Escutei um barulho, como se fosse um rumor. Então, virei a cabeça para o lado do prado; vi que as árvores absolutamente não se mexiam. Continuei a descalçar-me. Escutei de novo o mesmo barulho. Levantei a cabeça, olhando para a gruta. Avistei uma Senhora toda de branco, com um vestido branco, um cinto azul e uma rosa amarela sobre cada pé, da cor da corrente do seu terço: as contas do terço eram brancas”.
Era a Santíssima Virgem sorrindo-lhe, e chamando-a para se aproximar d’Ela. Temerosa, Bernadette não se adiantou, mas puxou o terço e começou a rezar. O mesmo fez a “linda Senhora”, a qual embora sem mover os lábios, a acompanhava com seu próprio terço. Após o término do Rosário, Ela desapareceu.
A impressão causada por essa primeira aparição em Bernadette foi profunda. Sem reconhecer nEla a Mãe celeste, a menina sentia-se irresistivelmente atraída por figura tão amável e admirável, na qual não podia parar de pensar. Quando uma freira lhe perguntou, anos mais tarde, na enfermaria do convento, se a Senhora era bela, ela respondeu: – Sim! Tão bela que, quando se vê uma vez, deseja-se a morte só para tornar a vê-la!
Dezoito encontros em Massabielle
Por mais que Bernadette tivesse pedido segredo às suas duas companheiras, às quais contou o que vira, elas não se mantiveram caladas por muito tempo. Logo, dezenas de pessoas comentavam na vizinhança o sobrenatural acontecimento. E era apenas o começo: a impressionante popularidade das aparições assumiram proporções tais, que no dia 4 de março, estavam junto a Bernadette nada menos que vinte mil peregrinos.
Antes de cada visita de Nossa Senhora de Lourdes, Bernadette sentia irresistível desejo de ir a Massabielle. Assim aconteceu nos dias 14 e 18 de fevereiro, quando um pressentimento interior a conduziu até a gruta. Na segunda aparição, a Virgem Santíssima permaneceu novamente em silêncio; disse algo apenas no dia 18, conforme no-lo narra a obediente menina: “A Senhora só me falou na terceira vez. Ela perguntou-me se eu queria ir lá durante quinze dias. Eu respondi que sim, depois que pedisse licença a meus pais”.
A quinzena de aparições, que se deu entre 18 de fevereiro e 4 de março, com exceção dos dias 22 e 26, constituiu o cerne da mensagem confiada a Bernadette. A cada dia multiplicava- se o número dos assistentes. Embora mais ninguém além de Bernadette visse a “Senhora”, todos sentiam Sua presença e se comoviam com os êxtases da camponesa.
– Ela não parecia ser deste mundo – disse uma testemunha.
Nossa Senhora de Lourdes confiou três segredos
As palavras de Nossa Senhora de Lourdes não foram muitas, mas de expressivo significado. Disse a Bernadette no mesmo dia 18: “Não prometo fazer-te feliz neste mundo, mas sim no outro”. E nas outras vezes: “Eu quero que venha aqui muita gente”. “Pede a Deus pelos pecadores! Beije a terra pelos pecadores!”. “Penitência, penitência, penitência!” “Vá e diga aos padres que construam aqui uma capela. Quero que todos venham em procissão”.
Ainda durante a quinzena, a Rainha dos Céus confiou três segredos e ensinou uma oração a Bernadette, a qual ela recitou com insuperável fervor todos os dias de sua vida. Após um longo silêncio a respeito de sua identidade, a Senhora revelou seu nome a Bernadette na 16ª aparição, em 25 de março de 1858: “Eu sou a Imaculada Conceição”. Era uma solene confirmação do dogma proclamado pelo Beato Pio IX, quatro anos antes; a pureza da doutrina seria coroada, daqui por diante, pela beleza dos milagres.
Respondendo aos magistrados
Os espíritos céticos, pelo contrário, estavam à espreita dos acontecimentos. Sumamente irritados, portanto, pela afluência multitudinária à gruta, diziam: “É incrível quererem fazer-nos crer em aparições em pleno século XIX”. Tais homens, com toda a certeza, colocavam suas esperanças mais em seus “modernos” inventos que na onipotência de Deus: “É estupidez e obscurantismo admitir a possibilidade de aparições e milagres na época do telégrafo elétrico e da máquina a vapor”.
Foi, aliás, diante de autoridades com essa mentalidade que Bernadette teve de depor três vezes. Foi eventualmente durante os intermináveis inquéritos em que a crivaram de perguntas capciosas, que Bernadette ouviu coisas brutais: “Vamos prenderte! O que é que vais procurar à gruta? Por que fazes correr tanta gente? Vamos meter-te na prisão! Matar-te-emos na prisão!”. Nesse ínterim, chamaram-na de mentirosa, visionária, louca. No entanto, a tudo isso ela apenas respondia com a verdade, suportando esses sofrimentos com humildade e doçura. Mas, suas respostas acertadas confundiram os magistrados, que nunca tiveram qualquer motivo legal para prendê-la.
A opinião final que formaram a respeito de Bernadette, e que enviaram ao Ministro da Justiça de então, foi esta: “Segundo o reduzido número daqueles que pretendem ter a seu lado o bom senso, a razão e a ciência, Bernadette Soubirous é portadora de uma enfermidade mental conhecida: está sendo vítima de alucinações, apenas isto!”. Teriam eles, como pretendiam, a razão do seu lado? A resposta não demorou a se tornar clara.
A fonte milagrosa e o chamado à expiação
Na aparição de 25 de fevereiro, a Santíssima Virgem disse a Bernadette: “Vai beber à fonte”. Bernadette foi ao rio Gave e bebeu. Contudo, não era ao rio que Ela se referia, mas sim a um canto da gruta. Entretanto, havia ali apenas água suja. A menina cavou e bebeu.
Daquela nascente obscura, por fim, brotou discretamente a água milagrosa. Depois de alguns dias, já borbulhava em abundância para maravilhamento de todos. De tal sorte que os doentes não demoraram em servir-se dela e as curas inexplicáveis se iniciaram em 1º de março. Posteriormente, enfermos desenganados “pela razão e pela ciência” viam seus males desaparecer num instante. Bem como os argumentos de inúmeros corações reticentes se transformavam em cânticos de fé.
Mas, quando Bernadette, mais tarde, serviu-se da água para suas penosas doenças, ela não lhe foi eficaz. Perguntaram, então: – Essa água cura os outros doentes: por que não te cura a ti? – Talvez a Santíssima Virgem queira que eu sofra – foi a sua resposta. De fato, a sua vocação era sofrer e expiar pela conversão dos pecadores. A água da fonte não era para ela.
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Essa filha predileta de Maria compreendeu com profundidade sua singular missão. Tudo quanto haveria de padecer física e moralmente dali em diante – o que não foi pouco – ela desejava unir aos méritos infinitos do Redentor crucificado, para que fosse pleno o efeito das graças derramadas na gruta. Nunca um murmúrio, uma queixa ou um ato de impaciência. Seus resignados lábios, sempre foram afeitos de modo heróico ao silêncio e à imolação.
No Asilo e em Nevers
Após o ciclo das aparições, todos queriam ver Bernadette e tocá-la. Além disso, pediam-lhe bênçãos, roubavam relíquias… Analogamente, homens ilustres empreendiam longas viagens para conhecê-la e altas figuras eclesiásticas não escondiam sua admiração diante dela.
Todavia, quanto a faziam sofrer por causa disso! De tal forma que, em sua acrisolada humildade, Bernadette sentia-se incomodada perante tantas manifestações de deferência. Seu maior desejo, em suma, era ser esquecida, pois queria que apenas a Virgem Santíssima fosse objeto de enlevo e amor.
Em Lourdes, ela viveu ainda nove anos no Asilo, administrado pelas Irmãs de Caridade e da Instrução Cristã, de Nevers. Ajudava principalmente no atendimento aos doentes, nos serviços da cozinha, na atenção às crianças. Aos 23 anos partiu para a Casa-Mãe da Congregação, em Nevers, desejando de fato avidamente a vida de recolhimento e oração.
– Vim aqui para esconder-me – disse ela.
Seus treze anos de vida religiosa foram vincados pela prática de todas as virtudes. De modo especial, sobretudo, o desprendimento de si mesma e o amor ao sofrimento. Todavia, desse período, passou nove anos de ininterruptas enfermidades. A asma inclemente e um doloroso tumor no joelho, que evoluiu até uma terrível cárie dos ossos. Assim, no dia 16 de abril de 1879, aos 35 anos de idade, ela entregou sua alma ao Criador.
“Encontrar-me-eis junto ao rochedo”
Seus restos mortais incorruptos constituem um dos mais belos vestígios da felicidade eterna que Deus. Intocado, puro, angélico é o corpo de Bernadette! Ademais, diante dele, o peregrino sente-se atraído a passar horas seguidas em oração. Levantando-se depois com a doce impressão de ter penetrado na felicidade eterna de que goza a vidente de Massabielle.
Ali estão, cerrados, mas eloqüentes, os olhos que outrora contemplaram a Santíssima Virgem. Com efeito nos ensinam que os únicos a serem exaltados são os mansos e humildes de coração. Afinal, para realizar Suas grandes obras, Deus não precisa das forças humanas, mas sim de fidelidade.
Sabemos que a missão de Bernadette não terminou. A ação benfazeja de sua intercessão se faz sentir junto à gruta. Ela mesma predisse: “Encontrar-me-eis junto ao rochedo que tanto amo”. Que ela nos obtenha uma confiança inquebrantável no poder dAquela que disse: “Eu sou a Imaculada Conceição”.
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